quarta-feira, 27 de abril de 2011

Contencioso Administrativo,um processo de objecto ou um processo de partes?

O Modelo Francês, baseado na doutrina do "processo ao acto", conferia ao Contencioso Administrativo mera natureza objectiva,neste caso, nem o particular nem a Administração eram considerados partes e apenas figuravam em tribunal com o único objectivo de com este colaborar para a defesa da legalidade e do interesse público.
Na Doutrina Clássica ao particular não era reconhecida a titularidade de direitos subjectivos, sendo um mero "administrado", e muito menos lhe era reconhecida qualquer  relação com as autoridades administrativas ditando assim a sua exclusão como parte no processo administrativo. Este modelo girava, assim, em torno do acto administrativo, ao mesmo tempo que desconsiderava os direitos subjectivos.
Esta situação deve-se ao facto de na época clássica existir confusão entre Justiça e função Administrativa. Ora, como o tribunal e o autor do acto constituíam uma só parte, jamais se poderia falar num processo de partes, visto que, este se constroi numa lógica assente  na posição do juíz como um terceiro face a dois interesses opostos que lhe são apresentados(processo de natureza subjectiva).

 Esta "promiscuidade" entre Admnistração e Justiça só foi efectivamente superada com a integração do Contencioso Admnistrativo no poder Judicial e desta forma foram superados os "traumas da infância" sendo o contencioso hoje um processo de partes, artigo 20 nº1 e 2, artigo 268 nº 4 e 5 da CRP.
Hoje estamos perante um contencioso Jurisdicionalizado e de natureza subjectiva actuando as partes , o particular e a administração,  perante um juiz onde defendem as suas posições. O particular afirma a lesão de um direito, a administração reclama a defesa da legalidade e do interesse público. Esta é chamada a tribunal de forma a poder clarificar as razões da sua actuação concreta.

O Contencioso de natureza subjectiva é fundamentado pelo principio da Igualdade efectiva na participação processual ,artigo 6º CPTA,igualdade esta, que como refere o artigo,se estende não só as possibilidades de intervenção no processo mas também a faculdade e uso dos meios de defesa,a  aplicação de sanções processuais,designadamente por litigância de má fé e a responsabilização das partes pelo resultado do processo através da condenação  ao pagamento das custas.
Os passos em frente dados no código no sentido de se reforçar as exigências de igualdade entre as partes são assinaláveis sendo um dos mais importantes, o respeitante ás imposições dos encargos financeiros também ao Estado e a quaisquer entidades públicas.
No anterior direito processual português a administração não pagava as taxas, as custas e demais encargos
do processo que ao invés recaiam sobre a sua contraparte sendo evidente que o elevado sacrificio financeiro levava, muitas vezes,o  particular a abster se de requerer as diligências e de praticar actos processuais que, no entanto,eram gratuitos para a Administração do Estado, das Regiões Autónomas ou das Autarquias Locais. Só assim não era quando aquele que se  opunha à Administração isenta também estivesse isento dos referidos encargos, como sucedia caso litigassem entre si Estado e Municipios.
Fiel à sua aspiração de igualdade das partes no processo administrativo o legislador rompeu com a tradição processual submetendo o pagamento de custas "ao Estado e demais entidades públicas" artigo 189 nº1 CPTA.
Esta igualdade é complementada á luz do artigo 8 nº1 do CPTA pelo principio da cooperação e boa fé processual que visam respectivamente obter uma pronta e adequada resolução de litigios aliada à boa fé das partes de forma a evitar diligências e dilações consideradas inúteis, atigo 8º nº2 CPTA. A formulação dos referidos artigos tem como destinatário o próprio tribunal Administrativo, que deve assegurar e promover  um estatuto efectivo e substancial de igualdade processual com vista a consagração de um processo equitativo.
Esta ideia passa,por exigir ao juiz administrativo que, no exercicio das suas faculdades de condução, direcção e instrução do processo, trate as duas partes e os interesses que estas representam (que podem não ser materialmente iguais) como sujeitos e  interesses iguais, dando lhes para isso, se necessário um  tratamento  desigual de forma a superar as diferenças resultantes da posição mais ou menos frágil em que uma ou outra se encontre, principio da igualdade  na sua vertente de obrigação de diferenciação.
De salientar que , no que se refere ao principio da cooperação,artigo 8 CPTA, estamos perante principios gerais que valem para todos os sujeitos do processo, no entanto o nº3 e 4  do referido artigo não valem para todos os sujeitos nem para todos os processos administrativos. Por um lado tratam se de exigências que impendem exclusivamente sobre a administração e por outro  só parecem ter lugar naqueles casos em que ela é chamada a acção na qualidade de autoridade administrativa, para averiguar  da legalidade e da responsabilidade pelos actos ou normas emitidos ou omitidos nessa qualidade.


A ideia concretizadora do processo administrativo como de partes encontra se subjacente as regras sobre a legitimidade que figuaram  no artigo 9 e seguintes do CPTA , enquanto pressuposto relativo aos sujeitos processuais a legitimidade é inerente à qualidade de parte.
A doutrina clássica ,que considerava o interesse  condição de legitimidade, concretizava este pressuposto processual através do interesse do particular em afastar da ordem jurídica o acto administrativo.
Actualmente o critério é o da atribuição de legitimidade,na relação processual, em razão da posição dos sujeitos e da alegação de direitos e deveres reciprocos na relação jurídica substantiva.
 O Prof. Vasco Pereira da Silva considera que a visão actual de legitimidade nos confere uma "visão adequada e já nao hipervalorizada, como outrora, da legitimidade no contencioso Administrativo, similar a desempenhada pelo processo civil", destinada a ligar a relaçao material substantiva e a relação processual conferindo aos participantes uma posiçao efectiva de sujeitos na relaçao material controvertida  e " não uma concepção que pretende substituir se à consideração das situações juridicas das partes e arvorar -se em critério exclusivo de determinação de acesso ao juiz".


Conclui se, hoje que o processo Administrativo é um processo de partes e não um processo objectivo considerando o Prof Vasco Pereira da Silva que os pressupostos que negavam a qualidade de parte aos sujeitos no Contencioso Administrativo não se podem verificar no actual Estado de Direito.

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