segunda-feira, 23 de maio de 2011

O Contencioso Pré-Contratual


O processo contencioso de impugnação de actos pré-contratuais é, entre nós, um dos poucos exemplos de “regimes procedimentais substantivos ad hoc”, a que a lei concede um tratamento processual específico. Isto acontece, muito pela influência do direito da União Europeia (lembremo-nos que este meio processual chegou até nós por via da transposição da Directiva 89/665 CE de 21/12/1989), mas também pelo peso económico que os contratos administrativos representam na sociedade.

No regime actual, a impugnação de actos administrativos relativos ao procedimento pré-contratual, encontra-se previsto no artigo 100º do CPTA e abrange quatro tipos de contratos: empreitada, concessão de obras públicas, prestação de serviços e fornecimento de bens. Assim, significa que, à contrário, não estarão abrangidos por este meio processual quaisquer outros tipos contratuais, o que demonstra, aquilo que alguns autores denominam de, “dualismo processual”, este é também o entendimento que resulta da leitura conjunta dos artigos 46.º/3 e 100.º CPTA.

Com a tipificação do regime deste meio processual, pretendeu-se essencialmente acautelar os interesses tanto públicos como privados, actuando primacialmente, através da promoção da transparência e da concorrência, procurando assim assegurar uma protecção adequada dos interesses dos candidatos à celebração de contratos com as entidades públicas. Houve ainda uma clara preocupação de garantir a estabilidade dos contratos da Administração após a sua celebração, a qual se visou obter conferindo protecção adequada aos interesses públicos substanciais em causa e aos interesses dos contratantes.

Relativamente às particularidades do regime, este meio deve ser utilizado quando estejam em causa quaisquer decisões administrativas relativas à formação dos referidos contratos, dado que, como resulta da conjugação dos artigos 100.º/3 CPTA e 4.º/1- e) ETAF, ele é apto, quer à impugnação de actos administrativos pré-contratuais, quer ainda à dos actos equiparados de entidades privadas. Para além do referido, o processo previsto no artigo 100º do CPTA é igualmente o meio idóneo para a impugnação directa de documentos contratuais normativos que incluem o programa de concurso, o caderno de encargos ou qualquer outro documento conformador do procedimento pré-contratual, designadamente com fundamento na ilegalidade das especificações técnicas, económicas ou financeiras (artigo 100º/2 CPTA). Excepcionalmente, prevê-se ainda a possibilidade de impugnação do próprio contrato, caso o mesmo venha a ser entretanto celebrado (artigos 102.º/4 e 63.º/2 CPTA).

Quanto ao prazo para que o interessado se faça valer deste mecanismo contencioso, é de um mês, a contar da notificação dos interessados ou, não havendo lugar à mesma, do conhecimento do acto (artigo 101.º),e ainda que se dê o caso de existirem impugnações administrativas necessárias, o prazo será igualmente de um mês em razão da urgência processual e conta-se a partir do termo do prazo legal para tal decisão, havendo omissão da decisão do recurso. Já no que respeita aos outros requisitos, aplicar-se-ão, por força do artigo 100.º/1 do CPTA, com as adaptações que se revelarem necessárias, as regras relativas à impugnação de actos. Entre estas, assumem particular relevância, aquelas respeitantes à legitimidade (artigo 55.º CPTA) e à prossecução da acção pelo MP (artigo 62.º CPTA).

Para além disso, no que se refere à tramitação, esta segue a da acção administrativa especial, sofrendo no entanto algumas nuances (as quais são enunciadas nos artigos 102º e 103 CPTA), de onde se destacam nomeadamente, a possibilidade de realização de uma audiência pública sobre a matéria de facto e de direito, com alegações orais e sentença imediata (artigo 103º), e a faculdade de, em caso de impossibilidade absoluta de satisfação dos interesses do autor, o juiz não proferir a sentença requerida e convidar as partes a acordarem no montante da indemnização devida, seguindo os trâmites previstos no artigo 45º CPTA (artigo 102º/5).

Finalmente, quanto aos efeitos da sentença, esta será, em regra, anulatória ou de declaração da invalidade do acto ou documento contratual.

Contudo, seguindo o entendimento de Rodrigo Esteves de Oliveira, parece que o contencioso pré-contratual é ainda, um meio “estigmatizado” pela acção administrativa especial de invalidação de actos administrativos, caracterizada apenas pela urgência e encurtamento de prazos.

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